A crise do coronavírus, que desde março assola o Brasil, desafia o país em suas mais diversas estruturas. Além da saúde, setores como o agronegócio, a educação e o setor de serviços tiveram que readaptar suas estruturas e modelos de negócio para poderem sobreviver durante a crise.
Nesse contexto, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. O presente artigo, portanto, objetiva analisar a MP em questão, evidenciando principalmente as medidas trabalhistas por ela instituídas com foco nos recursos à disposição do empregador para aliviar a situação financeira de sua empresa.
I – Redução proporcional de jornada de trabalho e de salários
A primeira medida do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, instituído pela MP 936/2020, é a redução proporcional da jornada de trabalho e de salários. Nessa, o empregador pode, por meio de acordo individual ou coletivo, reduzir parcialmente a jornada do colaborador, reduzindo também proporcionalmente o seu salário.
Essa redução, que poderá se estender por até noventa dias, tem de observar os seguintes requisitos:
I – a preservação do valor do salário-hora de trabalho;
II – a pactuação por acordo individual escrito entre empregador e empregado, que será encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos; e
III – a redução da jornada de trabalho e de salário, exclusivamente, nos percentuais de 25%, 50% ou 70%.
A medida provisória prevê ainda quando deverá ser reestabelecida a jornada de trabalho e o salário pago anteriormente. Isso se dará no prazo de dois dias, a contar: (i) da cessação do estado de calamidade pública; (ii) da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período e redução pactuado; ou (iii) da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre a sua decisão de antecipar o fim do período de redução pactuado.
Por meio de convenção ou o acordo coletivo de trabalho, podem o empregador e os empregados estabelecer percentuais de redução de jornada de trabalho e de salário diversos dos descritos acima.
II – Suspensão temporária do contrato de trabalho
O segundo recurso de qual pode o empregador dispor durante o estado de calamidade pública decorrente da emergência de saúde pública internacional relacionado ao coronavírus é a suspensão temporária do contrato de trabalho. Essa suspensão poderá ter prazo máximo de sessenta dias, fracionáveis em até dois períodos de trinta dias.
Para se utilizar desse recurso, o empregador deve pactuar a suspensão temporária por meio de acordo individual escrito entre empregador e empregado, que deverá ser encaminhado ao empregado com antecedência mínima de dois dias corridos.
Enquanto estiver suspenso o contrato de trabalho, o empregado fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados, tendo ainda autorização para recolher ao Regime Geral de Previdência Social na condição de segurado facultativo.
Em situação idêntica à redução proporcional da jornada de trabalho e de salários, o contrato de trabalho suspenso será reestabelecido no prazo de dois dias corridos contados: (i) da cessação do estado de calamidade pública; (ii) da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período e redução pactuado; ou (iii) da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre a sua decisão de antecipar o fim do período de redução pactuado.
Durante o período da suspensão, o empregado não poderá manter as atividades de trabalho, ainda que parcialmente, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância. Caso isso ocorra, ficará descaracterizada a suspensão temporária do contrato de trabalho, sujeitando o empregador:
I – ao pagamento imediato da remuneração e dos encargos sociais referentes a todo o período;
II – às penalidades previstas na legislação em vigor; e
III – às sanções previstas em convenção ou em acordo coletivo.
Detalhe importante da modalidade de suspensão temporária de contrato de trabalho é que a empresa que, no ano-calendário de 2019, tiver auferido receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 só poderá suspender o contrato de trabalho de seus empregados se lhes pagar ajuda compensatória mensal. A ajuda, no valor de 30% do salário do empregado, deverá ser paga durante a suspensão temporária do contrato de trabalho.
A ajuda compensatória mensal poderá ser cumulada com o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, sobre o qual se debruçará mais adiante. Essa ajuda poderá ser excluída do lucro líquido para fins de determinação do imposto sobre a renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real. Além disso, ela (i) deverá ter o valor definido no acordo individual pactuado ou em negociação coletiva; (ii) terá natureza indenizatória; (iii) não integrará a base de cálculo do imposto sobre a renda retido na fonte ou da declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física do empregado; (iv) não integrará a base de cálculo da contribuição previdenciária e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários; e (v) não integrará a base de cálculo do valor devido ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
III – Detalhes importantes a serem observados
Para a utilização correta e segura das medidas acima descritas, alguns detalhes importantes da MP 936/2020 devem ser observados pelos empregadores.
O Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda foi criado para complementar a renda do empregado nas hipóteses da redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho. Nesse contexto, é fundamental estar cristalino o dever do empregador de informar ao Ministério da Economia a redução da jornada de trabalho ou a suspensão do contrato de trabalho, no prazo de dez dias a partir da data da celebração do acordo.
Caso o empregador não informe a celebração de acordo de redução de jornada de trabalho ou de suspensão de contrato de trabalho ao Ministério da Economia, ele ficará responsável pelo pagamento da remuneração no valor anterior à redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho do empregado, inclusive dos respectivos encargos sociais, até a que informação seja prestada.
Outro ponto a ser observado é que ao empregado que em decorrência da redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho receber o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda fica assegurada garantia provisória no emprego durante o período da redução ou da suspensão e, depois desse período, por tempo equivalente ao da redução ou da suspensão.
Caso o empregador dispense o empregado sem justa causa no período da garantia provisória ele se submeterá ao pagamento, além das parcelas rescisórias padrões na demissão, de indenização no valor de:
I – 50% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 25% e inferior a 50%;
II – 75% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 50% e inferior a 70%; ou
III – 100% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e de salário em percentual superior a 70% ou de suspensão temporária do contrato de trabalho.
Além disso, é importante destacar que o tempo máximo de aplicação das duas medidas descritas no presente artigo, a redução proporcional de jornada e de salário e de suspensão temporária de contrato de trabalho é de noventa dias, respeitado o prazo máximo de sessenta dias previsto para essa última.
Por fim, ressalta-se que as duas medidas sobre as quais foi tecida a presente análise poderão ser implementadas por acordo individual ou negociação coletiva apenas aos empregados com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 ou portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (R$ 12.202,12). Para os demais empregados, essas medidas apenas poderão ser adotadas por convenção ou acordo coletivo, com exceção da redução da jornada de trabalho e de salário de 25%, que poderá ser pactuada por acordo individual.
Caso sejam pactuados acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, estes deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral em até dez dias corridos, contados da data da celebração do acordo.
IV – Conclusão
Resta evidente que a Medida Provisória nº 936/2020 estabeleceu medidas para, ao mesmo tempo, aliviar o ônus financeiro da crise nos empregadores e proteger os empregados, criando recursos para que os interesses de ambos sejam conciliados.
Aos empregadores, portanto, cabe se atentar aos pormenores aqui descritos para que, na redução proporcional de jornada e de salários ou na suspensão do contrato de trabalho, não cometam ilícito e obtenham êxito em zelar pela saúde financeira de sua empresa.